A ilusão do cliente feliz: como o NPS pode estar corroendo o seu negócio por dentro

Seu NPS está mentindo para você e talvez seja por culpa sua.

Imagine o seguinte cenário: uma empresa de tecnologia comemora um NPS de +65. Apresentações internas são feitas, banners são espalhados nos corredores e o time de liderança celebra a “satisfação do cliente”. 

Mas, ao mesmo tempo, a taxa de churn aumentou 12% nos últimos dois trimestres. As renovações de contrato diminuíram, e o número de reclamações no atendimento dobrou. Como isso é possível?

A resposta está no que ninguém quis ver: o NPS estava inflado por uma amostragem enviesada, só clientes engajados eram convidados a responder. Nenhuma análise foi feita sobre os feedbacks abertos. E, pior, os colaboradores, pressionados por metas, pediam “nota 10” diretamente ao final dos atendimentos. O número parecia alto, mas estava vazio.

Esse é o maior risco do Net Promoter Score. Não está em errar a conta, mas em confiar cegamente nela. Todos os dias, empresas tomam decisões baseadas em um número sedutor, mas disfuncional. Um NPS alto pode parecer uma medalha, quando na verdade é só um disfarce.

Disfarce de quê? De processos quebrados. De clientes insatisfeitos que não foram ouvidos. De uma cultura que se autoelogia sem se enxergar no espelho da verdade.

Quando mal conduzido, o NPS não revela a realidade. Ele a esconde.

O que você vai conferir neste artigo: 

  • Erro 1: Amostragem enviesada
  • Erro 2: Alteração da pergunta original
  • Erro 3: O foco cego no número
  • Erro 4: Ignorar detratores e não fechar o loop
  • Erro 5: Vincular NPS a metas e bônus
  • Erro 6: Tratar o NPS como número isolado
  • Entre a verdade desconfortável e a mentira confortável
  • Bônus exclusivo para os leitores
  • Sobre a autora e como implementar NPS com impacto real

Erro 1: Amostragem enviesada quando só quem gosta responde

Um dos erros mais comuns e perigosos do NPS está na forma como as respostas são coletadas. A maioria das empresas envia pesquisas apenas para clientes engajados, ignorando completamente os insatisfeitos, justamente quem traria os aprendizados mais valiosos.

Isso resulta em um NPS artificialmente alto, que conforta a liderança e mascara problemas estruturais.

CustomerGauge (2024) reforça que muitas empresas sequer divulgam a margem de erro das pesquisas. Isso significa que um NPS de +50, com uma margem de ±25, pode significar na prática qualquer coisa entre +25 e +75. Um abismo estatístico que coloca em xeque toda a análise.

A verdade: sem amostragem representativa, você não está ouvindo seus clientes, está apenas reforçando sua própria bolha.

Erro 2: Alterar a pergunta original e matar a metodologia

“Você recomendaria nossa empresa a um amigo ou colega?” Essa é a pergunta central do NPS. Simples, direta e comparável globalmente.

Mas muitas empresas insistem em reinventar a roda: mudam o enunciado, colocam a pergunta junto de outras ou ainda a adaptam para soar “mais amigável”. Resultado? Confusão, distorção e perda total de comparabilidade.

ClearlyRated (2024) aponta esse como o erro nº 1: “ask the wrong question”. Alterar o formato da pesquisa compromete a integridade da metodologia e coloca em risco qualquer análise posterior.

A verdade: simplicidade não é fragilidade. Alterar o NPS é como mudar as regras no meio do jogo, ninguém sai ganhando.

Erro 3: O foco cego no número e o vazio do vanity score

De que adianta saber que seu NPS é +60 se você não entende o porquê?

Tratar o score como objetivo final, sem mergulhar nas causas que levaram o cliente a dar aquela nota, transforma o NPS em métrica de vaidade, um número bonito que serve apenas para apresentações.

Survicate (2024) destaca que esse é um dos erros mais recorrentes: focar exclusivamente no score e ignorar os comentários abertos que acompanham a nota.

A verdade: o número é só o começo da conversa. Se você ignora o contexto, está fazendo uma leitura míope da experiência do cliente.

Erro 4: Ignorar detratores é um silêncio que custa caro

O cliente deu nota 2. E a empresa… nada faz. Nem um retorno, nem uma análise, nem um plano de ação.

Essa é uma das maiores traições ao propósito original do NPS: agir sobre os feedbacks recebidos. O sistema foi criado para fechar o loop, ou seja, ouvir, reagir e evoluir.

Segundo a Survicate (2024), “ignoring detractors” é um dos erros mais graves. As empresas coletam dados, mas os deixam esquecidos em planilhas, perdendo a chance de transformar experiências negativas em jornadas de reconquista.

A verdade: cada detrator ignorado é uma oportunidade de melhoria desperdiçada e um cliente a caminho da concorrência.

Erro 5: Vincular NPS a metas e bônus é a receita da manipulação

Imagine a cena: um colaborador, ao final de um atendimento, diz “se você puder dar nota 10, ajuda muito!”. Já viveu isso?

Esse comportamento é o efeito colateral de atrelar o NPS a bonificações, premiações ou campanhas internas. Quando o número vira moeda de troca, o resultado perde qualquer valor diagnóstico.

HSM Management (2024) alerta: ao fazer isso, o NPS deixa de medir lealdade do cliente e passa a refletir a pressão interna da equipe. Uma cultura de aparência se instala, onde todos fingem estar bem e ninguém fala sobre os verdadeiros problemas.

A verdade: NPS não foi feito para bater meta, foi feito para ouvir o cliente. Manipular a nota é maquiar a realidade.

Erro 6: Tratar o NPS como número isolado – sem conexão com o negócio

O NPS mede algo importante: intenção de recomendar. Mas isso, por si só, não garante recompra, nem reduz churn, nem gera receita.

Quando as empresas analisam o NPS de forma isolada, sem cruzá-lo com indicadores como taxa de cancelamento, frequência de recompra ou volume de indicações reais, estão criando uma bolha.

A Retently (2024) reforça: sem correlação com dados concretos, o NPS é só uma fotografia emocional, bonita, porém rasa.

A verdade: o poder do NPS está em integrá-lo à estratégia. Um bom número sem resultado é só ilusão.

Entre a verdade desconfortável e a mentira confortável

Um NPS mal conduzido é como um exame clínico adulterado: pode mostrar uma saúde perfeita, enquanto o corpo (ou o negócio) adoece por dentro.

E o que piora essa condição é o conforto. A sensação enganosa de que “está tudo bem”. Mas está?

O verdadeiro valor do NPS não está no número alto. Está na coragem de ouvir com profundidade, de analisar com rigor, de agir com intencionalidade.

Empresas que tratam o NPS com seriedade não celebram notas 9 e 10. Elas celebram descobertas difíceis, melhorias contínuas e, acima de tudo, a confiança genuína do cliente.

Acompanhe os bastidores e conteúdos diários no Instagram @necxa.school

Veja também:

Assine nossa newsletter